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Os monstros do roupeiro

Está escuro. O ar quente da minha respiração contrasta com o frio do quarto. Estou desprotegida e a preocupação não me deixa dormir. Apuro os ouvidos mas não me chega nada. Nenhum som. Estico a mão até ao interruptor mas está tão longe que tenho medo de me aventurar. Sento-me à beira da cama e esfrego os olhos para tentar descortinar alguma coisa no meio do escuro da noite. Nada. Nem daqui, nem do quarto ao lado. Assim que toco com os pés no chão lembro-me daquele filme de terror da televisão em que uma mão sai debaixo da cama e agarra os pés da senhora. Um arrepio percorre-me o corpo todo. Salto para fora da cama e com uma mão à minha frente sem esperar encontrar coisa nenhuma e outra a agarrar com toda a força a minha almofada de dormir aventuro-me até à porta. Rodo a maçaneta devagar, sem barulho, para não acordar os monstros que vivem dentro do roupeiro. Os meus pés quentes dão passos pequeninos, mas os maiores que alguma vês dei sozinha, no chão frio do corredor. Páro em frente à porta. Está entreaberta. Ainda nada. Entro devagarinho, como se fosse uma assombração e chego à beira da cama. É então que os ouço respirar. Aquele som inconfundível da respiração e do sono pesado de quem nos conforta o coração. A minha mão pequenina sente o calor da mão da minha mãe e o meu coração descansa. Tenho cinco anos e arrasto a minha almofada de volta ao meu quarto, à minha cama e ao meu sono. Agora mais pesado por saber que eles estão bem e que os monstros do roupeiro dormem profundamente.
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