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[uma vida inteira de trombas para ver a vida ir-se embora assim]






Para mim tem o mesmo efeito do que andar descalça na relva. Ou melhor. É andar descalça à beira mar nestes primeiros dias já atrasados da Primavera. Não há nada no mundo que pague isto. Chegar a casa, descalçar os saltos e tirar a roupa formal, enfiar uns jeans, uns chinelos e dar corda às perninhas até ao outro lado da estrada. Inspirar o ar salgado, queimar a cara com o sol do fim do dia. Passar pelos aglomerados de pescadores a tentar vender o que o dia lhes rendeu, ainda aos saltos dentro das caixas de plástico. É a frescura no seu melhor, a água límpida, a praia paraticamente deserta. Arejar as ideias, pensar em coisas boas, fazer uma espécie de discurso inspirador do dia. Porque a vida é isto. Acaba não tarda nada. 

"nestes momentos em que o cancro se torna assunto é inevitável pensar no meu pai. não nas saudades que tenho mas na doença que o matou. o meu pai foi, durante toda a vida, e muito por consequência da morte da minha avó com um cancro muito doloroso, um homem triste. aquelas pessoas sempre com duas rugas na testa, zangado com a vida. quando o meu pai descobriu que tinha cancro, não ficou zangado, entregou-se aos médicos e mostrava uma serenidade brutal. depois da primeira operação, em que lhe foi removido um tumor maior que uma bola de futebol, o meu pai mudou. fizemos viagens, mimou a minha mãe, passeava, jantava fora e sorria. disse-nos: uma vida inteira de trombas para ver a vida ir-se embora assim.
e essa frase marcou-me para a vida. para a minha vida."

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2 comentários

  1. A vida é, sem dúvida, um instante! E às vezes é roubada cedo demais...
    E tantas vezes esquecemos de valorizar e aproveitar os pequenos nadas que, na verdade, são tudo...
    Felizmente, tenho os meus familiares todos comigo. Os que já não tenho, foi a velhice que os levou...

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  2. Verdade. São tantas as vezes que não damos valor ao que temos...

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